As mulheres ganham, em média, 20,7% menos do que os homens em 50.692 empresas com 100 ou mais empregados, conforme revela o 2º Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, apresentado em 18 de setembro de 2024, pelos Ministérios das Mulheres e do Trabalho e Emprego (MTE). Os dados analisam informações da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2023, fornecidas pelos empregadores.
A nova edição do relatório aponta um aumento na diferença salarial entre homens e mulheres, em comparação ao primeiro relatório divulgado em março de 2024, que indicava uma diferença de 19,4%. Segundo o Ministério das Mulheres, esse aumento reflete a criação de novos postos formais de trabalho em 2023, com 369.050 ocupados por homens e 316.751 por mulheres.
Desigualdade de gênero e raça
A desigualdade é ainda mais acentuada para mulheres negras, que ganham em média R$ 2.745,26, o que equivale a 50,2% do salário dos homens não negros, que recebem R$ 5.464,29. Para as mulheres não negras, a média salarial é de R$ 4.249,71, ainda inferior à remuneração masculina.
No que se refere a cargos de direção e gerência, as mulheres recebem 27% menos que os homens. Para as mulheres com nível superior, a disparidade é ainda maior, com salários 31,2% abaixo dos homens.
Igualdade salarial: prioridade do governo
Durante a apresentação do relatório, a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, reafirmou que a igualdade salarial de gênero para trabalhos equivalentes é uma prioridade do governo federal. Ela destacou a necessidade de mudança cultural em relação aos papéis de homens e mulheres no mercado de trabalho, enfatizando que as mulheres não devem ser vistas como “complemento salarial” dos homens. A ministra também sublinhou o papel central das mulheres na sociedade, sendo chefes de família em 50,8% dos lares brasileiros, de acordo com o Dieese.
“Ainda existe a ideia de que as mulheres são um complemento do salário dos homens, o que não é verdade. As mulheres são aquelas que mantêm suas famílias e precisam estar no centro do debate sobre desenvolvimento econômico e inclusão”, disse Gonçalves.
Desafios e iniciativas para combater a desigualdade
A igualdade salarial entre homens e mulheres é garantida desde 1943, pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas as desigualdades persistem. De acordo com a secretária-executiva adjunta do Ministério do Trabalho e Emprego, Luciana Nakamura, a Lei da Igualdade Salarial, aprovada recentemente, visa conscientizar as empresas e promover a igualdade salarial. Nakamura afirmou que a implementação da lei é um processo pedagógico e que o objetivo final é criar um ambiente de trabalho mais justo e equitativo.
O Relatório de Transparência Salarial não expõe empresas ou salários individualizados, mas tem o intuito de mostrar como as desigualdades se manifestam nos diversos setores da economia.
Estatísticas das empresas com 100 ou mais empregados
Entre as empresas com 100 ou mais empregados, o relatório destacou que:
- Em 31% das empresas, a diferença salarial entre homens e mulheres é de até 5%;
- 53% das empresas não tinham pelo menos três mulheres em cargos de gerência ou direção;
- 42,7% dos estabelecimentos tinham entre 0% e 10% de mulheres pretas ou pardas entre seus funcionários;
- Apenas 8,2% das empresas tinham política de contratação de mulheres indígenas;
- 0,2% dos estabelecimentos (85 empresas) não tinham mulheres empregadas formalmente em 2023.
Além disso, 22,9% das empresas possuíam política de auxílio-creche, enquanto 20% ofereciam licença paternidade/maternidade estendida.
Dia Internacional da Igualdade Salarial
A divulgação do relatório coincidiu com o Dia Internacional da Igualdade Salarial, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2019, com o objetivo de promover a igualdade de gênero no mercado de trabalho. Segundo a ONU, ao ritmo atual de mudanças, seriam necessários 300 anos para alcançar a igualdade de gênero globalmente.
Durante a apresentação do relatório, a representante da ONU Mulheres para o Brasil, Ana Carolina Querino, destacou que a desigualdade salarial reflete barreiras estruturais, como a misoginia, que impedem as mulheres de participar plenamente da vida pública.
Comentário do advogado Antônio Amauri Malaquias de Pinho
O advogado Antônio Amauri Malaquias de Pinho, especialista em direito trabalhista e igualdade de gênero, destacou a importância do relatório para a formulação de políticas públicas voltadas à equidade salarial. “O Relatório de Transparência Salarial oferece uma visão clara das desigualdades que persistem no mercado de trabalho brasileiro. A partir desses dados, o governo e as empresas podem desenvolver estratégias mais eficazes para combater a discriminação de gênero e raça”, afirma Pinho.
Ele também enfatizou que a implementação da nova Lei da Igualdade Salarial representa um passo importante, mas é necessário um esforço contínuo de monitoramento e fiscalização. “A desigualdade salarial é um reflexo de um sistema que ainda valoriza de maneira desigual o trabalho de homens e mulheres. Medidas mais rigorosas são necessárias para garantir que essa situação comece a mudar de forma concreta”, conclui o advogado.